Programa «Largo do Toural»: "Precisamos de mais quilómetros para cobrir todo o Concelho" afirma CEO da Guimabus
Ano e meio após ter iniciado a concessão do serviço de transporte colectivo no Concelho, a Guimabus fechou o primeiro semestre deste ano com aumento de 34 por cento de passageiros relativamente ao mesmo período de 2022. É um indicador do aumento da procura que não atingiu a meta definida pela empresa: chegar aos sete milhões de passageiros por ano.
Numa entrevista conjunta, o CEO e o director geral da Guimabus reconhecem que o transporte ainda não chega a todo o Concelho, esperando que novas propostas para reforçar a oferta nos sectores de Ronfe, Caldas das Taipas e São Torcato sejam validadas pelo Município.
Pode ouvir na íntegra AQUI:
CG - A operação da Guimabus está ou não estabilizada?
Fernando Salgado, CEO da Guimabus (FS)- Ainda não está como queremos. Em Janeiro de 2002, tivemos um arranque difícil em tempo de pandemia, com uma concessão que veio mudar completamente o que era a realidade do Concelho na oferta de transporte público. A nova rede uniu uma rede de 13 operadores e que já sofreu alterações, com reestruturações de linhas e frequências. Alterações que se traduziram num aumento do número de passageiros. Mas, precisamos de mais. Estamos a estudar alterações, aumentos de frequências, expansão para zonas que não estamos a servir e esperamos melhorar o número de passageiros, porque ainda não atingiu o que pretendemos.
CG - Qual é a meta do número de passageiros?
FS - A nossa meta era transportar sete milhões de passageiros no primeiro ano. Fechamos 2022 com quatro milhões 179 mil, por isso, faltam-nos quase três milhões. Este ano, verifica-se uma melhoria significativa.
No balanço do primeiro semestre em relação ao homólogo, regista-se um aumento de 34 %., mas durante esse período tivemos três meses de pandemia.
Os nossos principais clientes são os estudantes e os idosos. Historicamente, no Concelho já o eram. O nosso desejo é servir toda a população, em especial a população activa. Sabemos que em alguns casos, essas pessoas não viajam connosco porque não temos oferta. As melhorias que temos introduzido destinam-se a servir e a dar resposta a esse público.
CG - Que trabalho tem sido feito para responder às necessidades desse público-alvo?
FS - Só conseguimos captar passageiros do transporte particular se houver oferta para o cliente e se tivermos frequência, caso contrário as pessoas não trocam o automóvel pelo autocarro. Tem de haver fiabilidade no transporte e só reunindo estas três exigências conseguiremos atrair mais clientes.
CG - Desde o início da concessão já foram muitas as alterações introduzidas?
FS - Muitas. Ao plano de rede que recebemos nas peças do concurso iniciais, arrancamos em Janeiro de 2022 já com algumas alterações. A última alteração que teve mais impacto foi no sector de Abação em que foi efectuada uma reestruturação que se traduziu no aumento da procura.
Estão a ser equacionadas outras alterações e as propostas já foram submetidas ao Município de Guimarães. Aguardamos a aprovação, nomeadamente para a oferta do sector de Ronfe que articula com Leitões, Brito e Airão. Precisamos também de alterar o sector de São Torcato e das Caldas das Taipas.
A nossa operação funciona em rede e é natural que nem todas as freguesias têm ligações aos sítios que a população necessita, nomeadamente a população das Caldas das Taipas que não tem nenhuma linha que vá directamente ao coração da Cidade porque o destino é a Central de Camionagem. Mas, existe a Linha da Cidade que é pensada para servir o centro da Cidade. Obviamente, obriga a um transbordo. Muitas das linhas tocam o centro da Cidade, mas outras não.... Temos uma rede de transportes do Município e existe informação dirigida ao público.
CG - O princípio de levar o transporte onde estão as pessoas continua a nortear a Guimabus?
FS - Esse foi o nosso princípio e continua a ser. O transporte público se não cobrir todo o Concelho e se não tiver frequências, não terá o número de utilizadores desejado.
CG - Quais são as principais reclamações dos utilizadores da Guimabus?
Sérgio Ferreira (SF) - Recebemos vários tipos de reclamações e somos muito fiéis e atentos. Podemos dividi-las em três grandes grupos: com as circulações, quando surge um corte ou atraso; a oferta que não temos e que as pessoas nos fazem chegar e foram muitas as alterações que efectuamos para atender a essas pretensões, mas não está só na nossa dependência; a forma como o serviço é prestado porque não temos autonomia total no cumprimento dos horários porque dependemos do tráfego e isso condiciona muito, sobretudo no coração da Cidade, onde temos por vezes alguma supressão de circulações porque é impossível em determinados períodos e horários e em determinados dias de semana, nomeadamente à sexta-feira, cumprirmos algumas circulações porque não temos ainda uma prioridade face ao automóvel. São muito poucos os corredores existentes. Temos trabalhado com o Município no sentido de nos dar alguma prioridade e colocar o transporte público em primeira linha.
CG - Nesta competição entre o automóvel e o autocarro, tem havido ganhos?
SF - O número de passageiros transportados demonstra que temos mais passageiros. O nosso objectivo é conquistar passageiros ao transporte individual, objectivo colectivo do País e do Mundo. Devemos considerar dois eixos: o custo, o programa de apoio à redução tarifária ajudou muito e já temos títulos a um nível interessante para o número de passageiros; e o problema da prioridade e frequência. Só trabalhando este segundo eixo é que vamos conseguir ganhar passageiros ao transporte individual.
Temos um crescimento no número de clientes do público regular, por força da redução tarifária, sendo certo que para aumentar o número de utilizadores era necessário ter um zonamento e um tarifário mais simplificado, no sentido de tornar a oferta de transporte mais clara e mais apelativa. Nós temos ainda um processo de aquisição de títulos muito burocratizado, porque são títulos financiados pelo Estado, pelas autoridades de transporte - a CIM do Ave e o Município de Guimarães - e o processo deveria ser mais ágil no sentido de captar mais passageiros e tornar esta aquisição do título mensal mais expedita e imediata.
CG - O zonamento também deveria ser mais simplificado?
SF - Temos um zonamento complexo para uma rede que se quer simples, ágil e moderna.
Evoluímos de um zonamento que existia em Guimarães nos anteriores transportes urbanos que era de duas zonas para 101 zonas e muitas vezes é difícil o cliente decifrar que título tem de adquirir e até onde pode viajar e há muita limitação na utilização deste título.
Um passageiro que tenha 90 por cento das suas viagens numa determinada origem/destino se os 10 por cento que restam forem numa outra zona o título já não vai funcionar. Por vezes, há a dificuldade em fazer a aquisição do título em função das viagens que faz quando se pretende que o transporte público seja o mais aberto possível para que as pessoas não fiquem restringidas aos movimentos pendulares, porque as pessoas vão ao cinema, visitam familiares, praticam desporto dentro da rede da Guimabus.
CG - Num processo dinâmico, esta questão precisa de outro olhar para que seja melhorada a atractividade do transporte público?
FS - Numa rede urbana, os passageiros devem ter flexibilidade para utilizarem o transporte público. Temos vindo a melhorar e não está ainda como gostaríamos. Por isso, o nosso trabalho é dinâmico para atrair cada vez mais pessoas ao serviço público da Guimabus.
CG - A frota que serve a operação tem a marca e o compromisso com a sustentabilidade?
FS - Quando a nossa empresa ganhou o concurso e até ao dia em que começou a operar, ouviram-se muitos comentários 'que a empresa não tinha capacidade', 'que não ia conseguir e não tinha experiência".
Acho que provamos a nossa capacidade porque apresentamos uma frota que qualquer concessionária, qualquer Autoridade de Transportes, qualquer Município a desejaria. Penso que ainda somos a concessionária que mais autocarros eléctricos tem! Tínhamos a obrigação com o Município através do caderno de encargos de ter um 21 autocarros eléctricos e hoje já temos 27, 34 por cento da nossa frota é eléctrica e que foi comprada nova, num investimento que já ultrapassou mais de 20 milhões de euros. Arrancamos a operação com 26 autocarros a diesel novos. Temos uma média de idade das nossas viaturas de três anos.
CG - Com o transporte tendencialmente gratuito a procura poderá aumentar?
FS - É uma decisão da nossa Autoridade. Não é da nossa competência. Temos o nosso tarifário e a Autoridade é que aplica os descontos. Se concordamos com eles ou não, a nossa Autoridade é quem decide os descontos que aplica, a quem aplica e como aplica.
Há um processo burocrático para a emissão do passe com descontos e já informamos a nossa Autoridade sobre o nosso entendimento.
CG - O transporte gratuito poderá induzir mais procura?
FS - No nosso entendimento, o esforço financeiro que a Câmara de Guimarães poderá fazer para isso acontecer pode não ser o suficiente, porque não adianta termos transporte gratuito se a população não tiver transporte. Se calhar, o que interessa é colocar esse valor que o Município possa estar disponível para gastar e chegar com o transporte às zonas que não servimos. Temos uma concessão com 3 milhões e 600 mil/Km por ano, quilómetros esses que são insuficientes para cobrir o Concelho todo. Precisamos de mais quilómetros para cobrir todo o Concelho. De facto, uma das maiores reclamações que temos da população é que o Concelho não é servido com igualdade: temos zonas com uma oferta espectacular e há zonas onde nem sequer vamos! É isso que faz falta neste momento!
CG - Para isso acontecer, torna-se necessário alargar o número de quilómetros contratualizados?
FS - Não só. Uma parte será converter alguns quilómetros que estão em excesso em algumas zonas cujas propostas estão no Município. Estamos a praticar ao nosso encargo quilómetros a mais do que somos obrigados e as nossas propostas traduzem-se na conversão de alguns quilómetros que estão em excesso em algumas zonas para locais que não têm serviço. Mas, sabemos que para cobrir o Concelho de igual modo é preciso mais quilómetros. Se calhar esses valores em vez de serem todos para a redução tarifária, por que não colocar algum valor para o aumento da oferta.
Por exemplo, uma das propostas que fizemos diz respeito a Moreira de Cónegos, na Linha 11. A viagem termina na Igreja, mas a freguesia e o concelho não terminam ali. Há a zona de Pereirinhas, em que a população para se deslocar a Guimarães tem de ir a Vizela e mudar de autocarro. Uma das propostas é a extensão da linha 11 e estamos à espera que a Câmara aprove. Lá está, com mais serviço, será necessário mais quilómetros, mas esta extensão conseguimos enquadrar na nossa oferta actual que não são 3 milhões e 600 quilómetros, estamos a fazer mais.
CG - É uma operação dinâmica?
FS - Sem dúvida. Vamos chegar ao final dos 10 anos com muitas alterações e algumas possivelmente por fazer. É normal. As zonas habitacionais, os parques industriais, os movimentos de pessoas estão constantemente em mudança e o transporte tem que acompanhar. É esse objectivo que estamos e continuaremos a cumprir.
Entrevista publicada no jornal O Comércio de Guimarães, edição de 12 de julho de 2023.
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