A Jornada Mundial da Juventude
Nos primeiros dias do passado mês de agosto, 1 a 6, decorreu em Lisboa mais uma Jornada Mundial da Juventude, seguramente o acontecimento
mais marcante das últimas décadas realizado no nosso país.
Este evento foi criado pelo papa João Paulo II no ano de 1984 e ocorreu na cidade de Roma, no Domingo de Ramos, o domingo anterior à Páscoa. Trata-se de um encontro de jovens de todo o mundo com o Papa, vivido como uma peregrinação e que inclui momentos de formação, de convívio, de oração, confissão e diferentes espetáculos, precedido de muitas semanas de preparação dos grupos intervenientes e de uma semana de acolhimento dos participantes estrangeiros, distribuídos por famílias das diferentes dioceses do país.
Teve como principais objetivos proporcionar a todos os participantes uma experiência de Igreja Universal (católica), constituindo um novo impulso à Fé, à Esperança e à Caridade (as virtudes teologais) do país de acolhimento.
O lema da Jornada Mundial da Juventude de Lisboa escolhido pelo Papa Francisco foi a citação bíblica do evangelho de Lucas: “Maria levantou-se e partiu apressadamente” (Lc1,39), assim realçando a importância do serviço como materialização e concretização do amor ao próximo, o maior mandamento da Lei de Deus, depois do amor a Deus.
Este evento, um verdadeiro momento de grandes emoções e de explosão de espiritualidade de massas, tocou o interior da generalidade de participantes assim como de quem, crente ou não crente, teve oportunidade de acompanhar seus principais momentos através dos meios de comunicação social.
Como nos tem vindo já a habituar o actual Papa, soam de suas palavras sentimentos que nos conduzem à profundidade dos ensinamentos da doutrina de Cristo, tantas vezes ignoradas no quotidiano daqueles que se dizem cristãos.
Depois de decorrido todo este tempo, continuam a ressoar as suas mensagens, como aquela que logo à chegada deixou aos responsáveis políticos e governamentais de Portugal, da União Europeia e das democracias ocidentais: “O mundo tem necessidade de Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de Pacificadora no leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente. Para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo?”.
“Para onde navegais Europa e Ocidente, com o descarte dos idosos, os muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios?”
“Como podemos dizer que acreditamos nos jovens se não lhes dermos um espaço sadio para construir o seu futuro?”
Dirigindo-se aos jovens, afirmava no Mosteiro dos Jerónimos: “é preciso sair da margem das desilusões e do imobilismo, afastar-se daquela tristeza melosa e daquele sidonismo irónico que nos assaltam à vista das dificuldades. Temos de o fazer para passar do derrotismo à fé. Não temamos enfrentar o mar alto porque no meio da tempestade e dos ventos contrários Jesus vem ao nosso encontro e diz: coragem, sou Eu, não temais”
“Na barca da igreja deve haver lugar para todos: todos, todos, todos.”
Mais tarde, na Universidade Católica, afirmava aos jovens: “desconfiemos das fórmulas pré-fabricadas, das respostas que nos parecem ao alcance da mão, extraídas da manga como se fossem cartas viciadas de jogar; desconfiemos das propostas que parecem dar tudo sem pedir nada”.
“Devemos reconhecer a urgência dramática de cuidar da casa comum. No entanto, isso não pode ser feito sem uma conversão do coração e uma mudança da visão antropológica subjacente à economia e à política. Não podemos contentar-nos com simples medidas paliativas ou com tímidos e ambíguos compromissos. Neste caso, os meios-termos são apenas um pequeno adiamento do colapso”.
No dia seguinte, no Parque Eduardo VII, dirigia-se novamente aos jovens, alertando para os males do mundo virtual, para a permanente presença dos algoritmos no escrutínio da vida das pessoas; ”são as ilusões do mundo atual e devemos estar atentos para não nos deixarmos enganar, porque muitas realidades que nos atraem e prometem felicidade mostram-se depois pelo que são: coisas vãs, supérfluas, substitutos que deixam o vazio interior.”
Afirmava ainda: “O que é que Jesus espera? Abrir a janelas de tua alma à plenitude da sua vida e do seu amor; limpar as tuas lágrimas escondidas, com a sua ternura; preencher a tua solidão com a sua proximidade; os teus medos com a sua consolação; aliviar-te dos pesos interiores que te oprimem; será as feridas dos teus pecados; fazer-te sair das paralisias da tristeza, da resignação, daquela acédia da alma que te apaga o entusiasmo; impelir-te a abraçar o risco do amor”.
No Parque Tejo, de entre muitas das afirmações aí proferidas merecem destaque: “a alegria não está encerrada na biblioteca, está noutro lado; não está guardada com chaves. A alegria há que descobri-la no nosso diálogo com os demais. E isso, às vezes cansa”.
“O único momento em que é lícito olhar uma pessoa de cima para baixo é para a ajudar a levantar-se”.
Foram muitos, os pensamentos transmitidos, em vários momentos, através de palavras simples, mas carregadas de conteúdo, dirigidas a todos, de modo especial aos jovens.
Ao longo dos dois milénios da história da Igreja, muitos foram os momentos difíceis que atravessou, alguns abalando, seriamente, a Barca do Senhor que em seu auxílio veio restabelecer seu rumo.
Recordo, sobretudo, o aparecimento das ordens mendicantes - Ordem dos Frades Menores (Franciscanos) fundada por S. Francisco de Assis, e a Ordem dos Pregadores fundada por S. Domingos de Gusmão (Dominicanos) surgidas em 1209 e 1216, como resposta aos tempos atribulados da Igreja de então que trouxeram uma nova vitalidade espiritual à Igreja, atraindo muitos seguidores devotos e inspirando outros a buscarem uma vida mais piedosa, enfatizando a devoção pessoal, a humildade e a simplicidade como elementos essenciais da vida cristã.
Nos tempos atuais, continuam a despertar movimentos que vêm acalmar o mar tempestuoso em que vive a Igreja. As jornadas Mundiais da Juventude, realizadas nos vários continentes ao longo destes 39 anos constituem, a meu ver, um desses movimentos.
De resto, jamais esqueço as palavras do Evangelho proferidas por Jesus quando, aos seus discípulos perguntava: e vós, quem dizeis que eu sou? Pedro tomou a palavra e disse: Senhor, Tu és o Messias, o filho de Deus Vivo. Jesus respondeu-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi a carne e o sangue que te o revelaram, mas sim meu pai que está nos Céus. Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”.
Guimarães,
4 de Setembro de 2023
António Monteiro de Castro