Evocação à indústria de curtumes da Corredoura na inauguração do Largo do Costa na vila de São Torcato
A Junta de Freguesia de São Torcato procedeu à inauguração da requalificação do Largo do Costa, um espaço que serve de ponto de encontro e de convívio na zona da Corredoura, numa cerimónia em que foi homenageado a título póstumo Severo Vaz e evocada a ligação daquele lugar à antiga indústria de curtumes.
O Presidente da Junta justificou o tributo às gentes ligadas aos curtumes da Corredoura, como forma de associar a Corredoura ao património industrial que a UNESCO reconheceu com o título de Património Mundial, referindo-se ao alargamento da área classificada do Centro Histórico à zona das antigas manufacturas de curtumes na Cidade. Alberto Martins defendeu realçou a importância de preservar a memória daquela actividade desenvolvida em contexto rural, considerando a obra importante para "resolver graves problemas no local e devolver dignidade a um espaço especial para a população". "O ofício de curtidor moldou o concelho industrial que é Guimarães e contribuiu para a classificação da zona de Couros para património mundial da humanidade", acrescentou o Autarca.
A cerimónia realizada na passada sexta-feira, 8 de dezembro, presidida pela vereadora Sofia Ferreira, contou com a presença dos vereadores Ricardo Araújo e Hugo Ribeiro, servindo para homenagear a título póstumo o antigo tesoureiro da Junta de Freguesia de São Torcato, Severo Vaz, "pela sua dedicação à vida autárquica e à defesa dos interesses da vila".
O evento contou ainda com a participação de Elisabete Pinto, jornalista do Grupo Santiago, autora do livro «Curtidores e surradores de São Sebastião (1865-1923) A difícil sobrevivência de uma indústria insalubre no meio urbano» e de um artigo intitulado "As Pilhadeiras da Corredoura", publicado na revista Veduta.
Na sua intervenção, fez alusão "à especialização na curtimenta de sumagre" existente outrora na Corredoura, destacando o papel das mulheres na relação com o trabalho árduo dos couros extinto naquela zona do Concelho em meados do século XX. "Registei em diferentes momentos, através de testemunhos orais, recolhidos junto de antigos trabalhadores e industriais, que “a indústria de curtumes nasceu no Lugar da
Corredoura, em São Torcato”. Quando partilhavam essa expressão, os seus olhos brilhavam, iluminando o rosto como se estivessem a proferir uma oração transmitida pelos seus antepassados. Efetivamente, ao atravessar o vale, ao sentir a força desta paisagem, ao percorrer esta “Corredoura”, este lugar de passagem, numa zona fértil, onde o verde dos campos e a tradição da comunidade permitem viajar no tempo e imaginar como seria anteriormente a pecuária, ligada à criação de gado bovino e caprino", afirmou, chamando a atenção para "a relação quase sagrada entre os homens e os animais" ao longo dos séculos.
"Por isso, a indústria de curtumes surgiu onde existiam peles com maior abundância, porque quando se abatia um animal tudo era aproveitado", observou, referindo-se à continuidade dessa relação na comunidade com a realização do concurso pecuário por ocasião da Feira dos 27.
A autora assinalou que a indústria de curtumes da Corredoura era especializada no curtume com sumagre, planta que possui o tanino indispensável ao processo de fabrico, abundante nas zonas de Lamego, Vila Nova de Foz Côa e Viseu, evocando a memória de Júlio do Marco apontado, em 1942, por A. L. de Carvalho, no livro "Os Mesteres de Guimarães" como o último industrial de tantas gerações que passaram pela curtimenta de sumagre na Corredoura", onde o trabalho que era feito, numa oficina aberta ao ar livre em pleno campo. "Só os melhores couros eram destinados ao sumagre, por isso eram criteriosamente escolhidos, num processo de fabrico algo distinto do praticado nas fábricas de Guimarães, em que participavam as mulheres, chamadas a "dar à pilha" e, por isso, apelidadas de pilhadeiras". "A curtimenta era mais breve do que a outra da Rua de Couros, podendo demorar mês e meio no verão e no inverno cerca de três meses", salientou, indicando que perdura na memória oral essa antiga actividade exercida em várias propriedades daquele lugar da vila de São Torcato.
Elisabete Pinto destacou a existência de uma pintura, de autoria da artista vimaranense Rita Ribeiro da Silva - agraciada na cerimónia -, intitulada "As Pilhadeiras da Corredoura", tendo sido confiados ao Presidente da Junta de Freguesia de São Torcato alguns bilhetes postais que reproduzem esse trabalho.
Foto: Facebook da Junta de Freguesia de São Torcato
Marcações: São Torcato, Rua da Corredoura