Ricardo Martins: "Estou livre e posso e devo avaliar as oportunidades"
Como explica esta sua saída do Berço quando se está perante um elemento que estava no clube desde 2016, precisamente a época da sua fundação?: "O mais prático seria dizer aquilo que é comum nestes momentos: “é futebol”. Não foi, nem poderia ser dessa forma tão simples. A nossa demissão foi devidamente ponderada e apresentada à direcção numa perspectiva colectiva, ou seja, defender os interesses do clube. A direcção tentou demover-nos, é a verdade, mas decidimos manter a nossa posição. Para nós era confortável continuar a trabalhar, mas por vezes são necessárias estas medidas para se tentar encontrar o caminho dos melhores resultados. Acredito que apesar da má fase poderíamos conseguir os objectivos, não foi por isso por falta de confiança no nosso trabalho, mas repito: estas decisões em alguns momentos trazem benefícios colectivos e o mais importante é sempre o clube e nunca um determinado elemento ou elementos".
Não sentiu, então, quebra de confiança da direcção? Simplificando, não foi despedido?: "Não. Nunca. Ao longo do meu trajecto no Berço nunca senti falta de confiança da direcção e as pessoas que dirigem o clube deram-me sempre as melhores condições..."
Mas foi “trocado” por Manuel Machado. Isso não foi uma falta de confiança?: "Nunca entendi dessa maneira. A ideia de trazerem o Professor foi-me explicada e depois de analisar e tentar perceber os eventuais prós e contras aceitei continuar na equipa técnica e disseram-me desde logo que o Professor fazia questão que todos ficássemos. Além disso, subi a equipa do Pró Nacional ao Campeonato de Portugal e mantive-me como treinador e a preparar essa época de estreia nos nacionais com antecedência. Ou seja, se essa chamada troca como diz fosse nessa época eu até poderia pensar em algo, mas não. Aproveitando a questão do Professor Manuel Machado. O clube pronunciou-se na altura sobre essa decisão e na parte que me diz respeito aproveito para dizer que para mim foi um privilégio integrar a sua equipa técnica pois aprendi com alguém que é uma referência em Portugal e com um currículo que fala por si. Vivi uma experiência que seria impossível viver de uma outra forma e entendo que para mim foi importante em vários aspectos. Sou hoje melhor treinador e melhor homem depois de ter privado com ele".
Estava a falar do apoio que teve no Berço quando o interrompi...: "Sim. Repito, nunca me faltou. Aliás, três semanas antes da decisão de sairmos, tivemos uma reunião de trabalho com a direcção para a analisar a razão das coisas estarem a vários níveis más e traçámos uma estratégia em conjunto. A direcção validou sem reservas o nosso pensamento, concordou e colocámos as coisas em andamento. Abdicámos de alguns jogadores, definimos o caminho para o reforço do plantel... Ou seja, tudo transparente e com confiança absoluta no pensamento sobre como poderíamos dar a volta. A verdade é que mesmo assim, sofremos duas derrotas, com Tirsense e Amarante. A resposta até foi boa pois a equipa reagiu bem à mudança de táctica, lutámos para vencer e as derrotas até foram injustas. Mas a verdade é que perdemos. Quando assim é, compete-nos analisar se o problema também não é nosso. Nós também erramos. Muitos anos até podem fazer a mensagem já não passar da mesma forma, enfim, há que reagir e fazer alguma coisa. Não podemos ser egoístas e pensar somente em nós. Fizemos uma análise e decidimos".
Saiu Ricardo Martins entrou Ricardo Teixeira... Espera que o nome Ricardo seja sinónimo de sucesso...: "(Risos) Eu torço todos os dias pelo sucesso do Berço. Quanto ao Ricardo que entra, falámos logo de seguida e fiz a passagem de testemunho que deveria ser feita. Não poderia ser de outra maneira. O diálogo existiu, continua a existir e existirá sempre que necessário".
Honestamente, já lhe caiu a “ficha” da saída do Berço?: "Mantenho a coordenação do departamento de formação juntamente com o Miguel Machado, por isso, não será fácil. O tempo encarrega-se disso, mas como é evidente deixei no Berço uma parte da minha vida. Foi em 2016 quando me ligaram a perguntar se queria ser adjunto do Tiago Gonçalves. Estava na Suíça a trabalhar, fiz as malas e voltei. Mesmo tendo passado por momentos duros no Berço, não me arrependo um minuto que seja. Fiz praticamente de tudo no Berço e não me arrependo, nem tenho vergonha do que fiz. O Berço nasceu em nada... mas é a prova de que vale a pena tentar. Nasceu com um projecto, depositou confiança nas pessoas e foi literalmente para a terra. Gerou desconfiança e inveja mas a verdade é que teve e tem sucesso. Eu integro um grupo de pessoas que deram muito ao Berço, mas o Berço deu-nos tanto também e deu-nos acima de tudo aquilo que falta na maioria das vezes, suporte e confiança para trabalhar. Houve respeito mútuo na relação e se calhar é por isso que na despedida a direcção disse que quem sabe se não é um fim de ciclo, mas antes uma interrupção de ciclo".
E o futuro? O telefone já tocou?: "Já tocou recentemente, como tocou nas épocas anteriores. No passado eu era do Berço, por isso não era assunto. Agora, estou livre e posso e devo avaliar as oportunidades. A minha ideia, sinceramente, é descansar algum tempo, reflectir e se estiver sem trabalhar procurar valorizar-me. Ou seja, qualificar-me e melhorar algumas valências para estar melhor preparado para outros e novos desafios. Estes anos de trabalho, muito intensos na preparação das épocas e nos desafios das subidas de divisão que tivemos, não deixaram espaço para formações, etc. Tenho o Curso de II Nível, estou a tentar o III e é muito difícil. Tentei recentemente na Escócia e esteve quase, mas agora com tempo poderei ter essa oportunidade. Em resumo, a prioridade é valorizar-me, mas estou sempre disponível para ouvir e avaliar novos desafios".
Depois do sucesso que teve só aceita treinar no Campeonato de Portugal?: "Eu tirei curso de treinador e não de treinador de esta ou aquela competição. Comecei de baixo em escalões menores, até como adjunto, valorizo todo esse trajecto, quero naturalmente o melhor, mas não tenho essa presunção de escolher dessa forma. Treinarei onde sentir que tenho condições para voltar a realizar um bom trabalho. Friamente, e porque saí de uma zona de conforto, vou encarar o próximo desafio com a noção de que tenho muito para fazer e dar a quem pretender contar com os meus serviços".
Marcações: Berço SC, Ricardo Martins