Dois irmãos são coveiros "certificados" em 10 freguesias de Guimarães
Os irmãos "Peixoto" são herdeiros de uma tradição familiar ligada a uma prática ancestral: escavar no solo dos cemitérios uma vala com dimensões adequadas às medidas da urna e assim, "com respeito, asseio e dignidade" proceder ao enterramento dos mortos.
Carlos Peixoto, de 52 anos, o irmão José, quatro anos mais novo, decidiram abraçar a actividade para darem seguimento aos ensinamentos do pai, mas também introduzir algumas mudanças, "para servir melhor as pessoas num momento que é sempre inesquecível na vida das famílias", assinala Carlos Peixoto.
"O meu avô materno já era coveiro. A actividade passou para um filho - meu tio - até que ninguém se dispunha a ficar com o serviço. O meu pai resolveu assumir... depois, seguiu-lhe os passos o meu irmão que faleceu há seis anos. Foi por isso que resolvi manter a tradição na nossa família", explica, motivado, ao detalhar os contornos do projecto em que conta com a colaboração do irmão. "Criamos os coveiros certificados, porque é assim que nos apresentamos perante a Segurança Social e as Finanças", acrescenta, vincando que a sua actividade profissional é "coveiro", embora já tenha sido padeiro e até empresário na área da restauração.
"Quando resolvemos abraçar este projecto, desde a primeira hora que assumimos que tínhamos de apresentar um serviço com todas as condições porque havia muito estigma em relação a esta actividade. Somos exigentes com a limpeza e higiene. Fazemos a cova e a terra é colocada em cestos, para que não fique espalhada nos cemitérios. O padre é importante na cerimónia, mas o nosso trabalho se não for bem feito nunca mais será esquecido. O funeral é um momento doloroso para as famílias que no cemitério despedem-se dos seus entes queridos", analisou Carlos Peixoto, ao recordar que começou por prestar serviços na freguesia de Ponte, alargando a sua oferta a outras freguesias da zona Norte do Concelho. "Já somos responsáveis por 10 cemitérios", observa, fazendo questão de alertar que é um ofício com alguma complexidade. "Um coveiro tem de ter físico, tem de ter uma certa estrutura para aguentar e enfrentar aquilo que se encontra ao remexer a terra. Somos feitos de pó, mas encontramos restos mortais de quem foi pai ou filho de alguém. Temos de ter o máximo respeito", comenta, ao sublinhar que conta com a cumplicidade do irmão na gestão de todo "esse processo".
Numa profissão quase em vias de extinção, os coveiros certificados são responsáveis pelos serviços nos cemitérios de Ponte, Corvite, Caldelas Vila Nova de Sande, Sande São Clemente, Sande São Martinho, Sande São Lourenço, Longos, Prazins Santa Eufémia e em Prazins Santo Tirso. "Temos muito trabalho e já não temos capacidade para protocolar os nossos serviços com outras freguesias, garantimos por vezes os nossos serviços se tivermos disponibilidade", afirma, recordando que a pandemia da Covid-19 deixou marcas profundas nas famílias que tiveram de enterrar os seus familiares "sem puderem fazer uma despedida digna". "Houve funerais em que as pessoas saíam do hospital directamente para o cemitério, sem um adeus", recordou.
Marcações: coveiros certificados