Em branco

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“Acho que já chega: os abstencionistas devem ser tratados como aquilo que são – auto-excluídos da democracia. E se não os querem penalizar, como eu acho que deveriam ser, ao menos que não os transformem em personagens principais...”““Acho que já chega: os abstencionistas devem ser tratados como aquilo que são – auto-excluídos da democracia. E se não os querem penalizar, como eu acho que deveriam ser, ao menos que não os transformem em personagens principais...”
Miguel Sousa Tavares. Expresso. 12 de outubro de 2019.

 

E lá se foram as legislativas de 2019. Vencedores e vencidos flagelaram-se com os números da abstenção. Faz parte mostrarem-se preocupados. Julgam ficar-lhes bem verbalizar essa aparente mágoa, mas nada efetivamente muda: 5,5 milhões de portugueses dignaram-se votar nas legislativas de 2011, 5,4 milhões passados 4 anos e agora apenas 5,1 milhões o que resultou numa abstenção, em território nacional, de 45,5%. Nada que chegue aos 70% das recentes europeias. Enfim.E lá se foram as legislativas de 2019. Vencedores e vencidos flagelaram-se com os números da abstenção. Faz parte mostrarem-se preocupados. Julgam ficar-lhes bem verbalizar essa aparente mágoa, mas nada efetivamente muda: 5,5 milhões de portugueses dignaram-se votar nas legislativas de 2011, 5,4 milhões passados 4 anos e agora apenas 5,1 milhões o que resultou numa abstenção, em território nacional, de 45,5%. Nada que chegue aos 70% das recentes europeias. Enfim.

O abstencionistas portugueses são uma classe à parte que tende a continuar a crescer. O sistema escusa de se preocupar: é apenas enfado! Não há forma de dar a volta a isto, o pessoal não quer saber. Os abstencionistas estão na esquina da democracia a olhar para quem passa e a dizer mal de toda a gente. De palito na boca são os maiores, é tudo fraco tirando eles. São os iluminados que não querem saber do escrutínio popular e que, mais tarde ou mais cedo, serão apetecível pasto para qualquer maluco mais inspirado num qualquer ódio de ocasião. Nas legislativas deste ano a campanha foi, poder-se-á dizer, elevada. E ainda por cima apresentaram-se a sufrágio 21 partidos ou coligações, um record absoluto na democracia nacional e uma paleta imensa de opções, algumas mesmo até hilariantes.Quem não fica na esquina da democracia são os portugueses que decidem votar em branco: 130.000, ou seja, dois estádios da Luz cheiinhos No entanto são democratas e acreditam na democracia, não acreditam em nenhuma proposta mas levantam o rabinho do sofá para irem votar. Outros, os nulos em território nacional, acrescentam-lhe sempre um toque de criatividade, este ano foram mais de 88.000, todos juntos encheriam o estádio de Alvalade e o D.Afonso Henriques ao mesmo tempo. É muita gente criativa.
Ganhou o PS com aquela cansaço marital verbalizado por vezes na frase preciso de um tempo sozinho. Farto das exigências das amantes vai tentar viver sem a responsabilidade da cansativa união poligâmica que tanto havia elogiado. Irá agora, suponho, saltar de amante para amante esperando o silêncio abstencionista das anteriores namoradas. Como um convencido marialva vai achar que elas estarão sempre disponíveis para o amor ocasional. Estarão?
Perdeu o PSD, não certamente pelos dois anos de liderança de Rui Rio, mas pelos dois anos antes disso. Pelos anos em que Passos Coelho se deixou penosamente arrastar pelo hemiciclo inconformado pela democracia parlamentar ter trocado o noivo à boca do altar. Pelo diabo, e pelos anos em que Maria Luís Albuquerque jurou ser impossível o governo conseguir os défices a que se propunha. Perdeu o PSD porque a Europa e o FMI ganharam no mandato de Costa o juízo que amplamente lhes faltou no governo de Passos Coelho. Rio exaltou-se no discurso da noite eleitoral. Está cansado pelo que passou e, certamente, farto por antecipação daquilo porque irá passar. Compreendo-o. 
No entanto as eleições são uma escolha legítima daqueles que se preocupam com o país e não um veredicto que iliba erros, omissões, malandrices. O caso de Tancos é um argumento de série B de tão mau que é. Orquestrou-se uma saída feliz para a imperdoável incúria do exército, para a roda livre em que se encontra. Nós – os que não sabiam de nada – iam comer a solução milagrosa que o próprio exército nos traria numa baixela militar. Azar, existe o Ministério Público e a PJ que fizeram o que lhes competia e uma Procuradora que só era pequenina em estatura.
As tropelias do Sócrates, do Salgado e da numerosa banda suporte que os acompanhou, alguns com futuras responsabilidades no próximo governo, deprimem-nos, no mínimo. No entanto a coisa sabe-se: isto é a democracia a funcionar, com a imprensa livre e o poder judicial a cumprir a sua obrigação. Não vamos é achar que o que não se sabe não existe. É preferível saber sempre e essa é uma das virtudes da democracia. Até o Ministério Público já acusa no Processo Marquês o juiz que empata as coisas de parcialidade. É preocupante, mas sabe-se.Não saber é mau. Não querer saber – de palito na boca ou não – é pior ainda.

Rui Vítor Costa

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